Em um dos dias de intervenção encontramos uma senhora que nos parou, de forma bem ríspida até, e disse:
-Palhaços, o que vocês estão fazendo aqui?
-Desejando um Feliz Natal!
-Eu não vou ter um feliz natal.
-Por que não?
-Por que meu marido morreu ontem...
55 anos juntos e agora eu não vou ter um natal feliz.
Entregamos tudo o que tínhamos nos bolsos pra ela e partilhamos da sua dor, era tudo o que podíamos fazer; entregar parte de nós e emprestar nossos ouvidos. Foi muito tocante encontrar alguém que sentia a dor da solidão nessa data e que só precisava desabafar um pouco... Ao fim desse encontro ela se despediu um tanto diferente; ainda com os olhos embargados de lágrimas, mas por onde saíram a dor de suas palavras vimos um pequeno sorriso tímido começar a brotar:
-Obrigado palhaços, com todo respeito!
-De nada, com todo respeito!
Existe um pensador chamado Armand Petijean que diz o seguinte:
“Não há nada que um humor inteligente não possa resolver com uma gargalhada, nem mesmo o nada”. (em Imagination et réalisation.)
O que vivemos ali não tem como explicar, o poder de transformação que esses encontros potencializam... E há um filósofo holandês chamado Spinoza que fala sobre encontros:
“...A vida é um permanente jogo de encontros. Se nesse jogo, um corpo combina com o nosso, as forças se somam e acontece um aumento da nossa potência, que é a alegria. Alegria se traduz em ação. Este é o bom encontro. O bom encontro traz um transbordamento de vida e potência (...)”.
Os encontros foram inumeráveis, conhecemos garis, policiais, vendedores, pessoas indo fazer compras, crianças que nos chamavam de dentro dos ônibus, mães que levaram seus filhos pra nos ver – por conta da divulgação do Brilha São Caetano, vôvôs e vóvós, corremos de cachorro, vimos cavalos, encontramos o Nicolas (um garoto que trabalha na banca de frutas ao lado da Fundação das Artes e que nos encontrou nos 8 dias de trabalho), tivemos o prazer de conhecer um ex palhaço pandeirista, pessoas voltando de viajem, alguns que nos reconheceram de outros eventos como a Entoada e o Dia de brincar, sorveteiros, açogueiros, motoristas, moto-boys...
Passamos pela R. Visconde de Inhauma,R. Sta Catarina, R. Piaui, Alameda São Caetano, Bairro Barcelona, R. Taípas, R. 24 horas e o túnel da estação Ferroviária – ao passarmos nesses dois últimos, sentimos uma mudança muito significativa com a nossa presença naqueles lugares que até parecem esquecidos, por conta da pouca iluminação e também por ser um lugar de passagem. O contato com essas pessoas foi muito gostoso, porque elas tinham uma certa resistência a nossa presença, mas nos olhavam com curiosidade e atenção...
(Gislaine Pereira - Elisa Betana)